segunda-feira, 28 de maio de 2012

AMAZÔNIA - Parte I



Popó pegou o seu barquinho e saiu puxando, levando embora as canoas, uma amarrada na outra, tal qual os burrinhos do Parque Municipal no fim de um domingo agitado. O barquinho e as canoas serpentearam rasgando o reflexo de ouro derramado pelo sol nas águas negras.
Parei de filmar por um instante só para ter a certeza de que as viagens haviam terminado. Deveria sentir-me alegre por estar voltando para casa, no entanto, não foi bem assim que eu me senti. Parecia que eu havia deixado algo ali naquelas águas. Algo tinha arrancado novamente o meu espírito e depositado em algum local perdido no Rio Negro. Olhei fixamente para o rio em busca do que me pertencia, mas ele não me devolveu.
O "Correa e Filhos IV", ladeado pelo "Alm. Pedro Correa VII" tomaram o rumo de Manaus enquanto o sol se afogava lento no negro rio. A bandeira do Estado do Amazonas, seguida pelo pavilhão nacional tremulavam no céu de azul pálido de mais um fim de tarde abafado e úmido, limpo e lindo, digno de uma despedida ou pintura. Os meninos faziam filas nas portas dos banheiros e tentavam organizar as malas despejadas no salão do barco.
Peguei o meu bloco de anotações e tentei rabiscar minhas emoções no exato momento, mas elas não vinham organizadas, como se fosse possível. As inúmeras experiências vividas nos 40 dias que passei em terras amazônicas ainda estavam borbulhando em minha cabeça!
O que mais me impressionou na Amazônia foi a sintonia e o respeito de um povo pela natureza e a simetria que a água de ébano proporciona com o céu, a terra, a noite e o dia!
Fui para a proa do barco observar a Capital que surgia logo a frente com sua ponte iluminada. "Silinha", cujo pai, Seu Silas eu conheci só por narrativas, chamou Ademar pelo rádio só para perguntar como era que um tal de "Zé Preto" chamava as ondas do rio quando revolto pelo vento.
Seu Silas, o patriarca, havia construído um legado naval familiar e plantara entre os entes a tradição da navegação. Dono de uma frota  considerável e uma retidão invejável, faleceu no domingo da terceira viagem. Os filhos ensinados e já encaminhados não tiveram dificuldades para seguir o caminho sem ele.
Aqui é igual a qualquer outra viagem, mas há o fator diferencial: o respeito à fúria da natureza e a aceitação às coisas da vida. E a morte está incluída neste processo.
Os valores são diferentes para os povos do rio. Aprender com eles é um desafio! É uma ótima oportunidade para rever os meus.
Não vi pessoas infelizes, apesar de pobres. Presenciei um choque cultural semelhante ao ocorrido na época do descobrimento: O encantamento do branco com o contraste de costumes! Os olhos claros misturando-se aos castanhos das peles, do cabelo, das pupilas e da terra dos nativos.
Eu vim ver a vida acontecer na Amazônia e me vi em alguns momento redescobrindo os meus limites. Emocionei inúmeras vezes com o diferente, com o meu Brasil, com os meus Brasis, com o Brazil!