quinta-feira, 23 de julho de 2009

DUAS CARTAS

A lua surgia preguiçosa arrastando-se pelos prédios e deixando o seu rastro luminoso nas poças abandonadas pela chuva da tarde sombria de Bharcelona. A luz do quarto de Penélope fugia pela janela com um amarelo ouro que tingia as quinas do telhado gotejadas de sereno.
Penélope havia recebido uma carta e há quatro dias temia sua leitura. Era o que mais aguardara, no entanto, era também o que mais entristecia.
Novamente olhou para o envelope. Fixou o olhar no selo que trazia sob o carimbo de Paris uma gravura em comemoração ao dia da criança. O desenho era de uma menina com sua bicicleta passeando no campo, seguida por seu cachorro e dois simpáticos passarinhos. Todos sorriam no desenho! Penélope também sorriu e lembrou-se de quando era criança e sonhava com castelos e princesas. Lembrou-se também do dia em que ganhou sua primeira bicicleta. Foi o dia mais feliz da sua vida de criança. Sentiu-se como a menina do selo!
Outros sonhos vieram. Uns se realizaram, outros foram esquecidos, outros ainda substituídos, mas o sonho de mudar-se para a encantadora Paris permaneceu sempre forte.
O envelope trazia o início da realização deste sonho, contudo, a distanciaria de Julián!
Num súbito de ansiedade e fúria Penélope agarrou o envelope e abriu-o. Enquanto avançava pelas linhas desistiu de conter as lágrimas, sentiu-se culpada por abandonar Julián no melhor momento das suas vidas. Imediatamente começou a escrever ao amado em letras trêmulas desviadas de gotículas de lágrimas:

Amor,

Não sei o que vai ser dos meus dias sem você. Não pense que é fácil e que meu coração não dói a cada passo adiante e a cada dia que o tempo engole. Não pense nunca que desrespeito a Deus pondo de lado um dos presentes mais perfeitos que ele poderia ter me dado. Não é uma troca de sonhos. É a confiança no destino, no velho ditado que diz
"o que tiver que ser, será!"
Sei que agora penso, quanto maior seu riso, menor ficará o meu longe dele. Às vezes me sinto culpada, me sinto má e leviana por pensar que posso fazer sofrer quem eu mais amo; conscientemente e planejar e te envolver, me sinto má por pensar que isso é normal e que tem que ser assim. Peço que comece a me perdoar agora, aos poucos... Perdoa-me, amor! Se você puder, me perdoa??!


Tenho você na minha mente, na minha pele, nos meus trejeitos...
Tenho você na minha fala, nas minhas veias, na minha vida...
Eu tenho você!

Tenho medo do amanhã e me agarro nos quase hipnóticos versos de um poeta maior, que sempre exerceram sobre mim um inexplicável e encantador fascínio e que rodopiam sem parar em minha cabeça:"que não seja imortal, posto que é chama, mas que seja infinito enquanto dure".

Ah meu anjo! Tentou esconder suas asas de mim e eu desconfiei e vi de relance e enxerguei uma pontinha e soube que era você! Agora penso que é pecado ter te trazido do céu. Sou sua e o mundo é nosso, só nosso a cada dia que restar.

Te amo sempre!

Penélope Aldaya.
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