terça-feira, 27 de janeiro de 2009

DAS FOTOS QUE EU NÃO TIREI!


Sempre tenho saudade das fotos que não consegui tirar, dos momentos que eu não fui capaz de capturar. Ou não estava com câmera preparada, ou não consegui nem levantar o braço diante tamanha poesia.
Resta somente descrevê-las do meu jeito, com a minha emoção. Elas estarão sempre comigo, no meu porta retratos particular, onde rotineiramente visito, relembro o exato momento em que a vi. E ali sempre tem uma história.

Lembro-me perfeitamente, indo de Recife para Rio Formoso (em Pernambuco), logo que o ônibus passou sobre uma ponte, observei lá embaixo um menino montado em seu cavalo negro, atravessando o rio e suas águas cor de barro. O negro do eqüino contrastou com o vermelho do rio. Com o corpo todo coberto, exceto o pescoço e sua crina na qual o menino se agarrava vorazmente, o animal fazia grande esforço, pois a correnteza não perdoava nada que ousasse desafiá-la transversalmente. Tal episódio durou uns 15 segundos. O motorista não parou para que eu observasse tudo isso, nem muito menos tive tempo para sequer pensar em câmera! A poesia ficou perdida por ali, sobre a ponte e aos poucos foi levada pelas águas do rio!

No dia em que eu voltava da casa de um amigo, passando por umas ruas desconhecidas, vi um garoto sentado em um toco de madeira, na porta da sua casa. Tinha um semblante triste e desanimado. Estava sem camisa e descalço. Comia vagarosamente uma pequena maçã e olhava o pouco movimento de carros na rua. O muro atrás dele trazia uma mensagem escrita sem capricho, cujo texto não consegui ler, e recordo que iniciava-se assim: “o sorriso perguntou para a lágrima...” Certamente é um poema popular, daqueles que as adolescentes costumam ter em seus caderninhos de anotações! A câmera estava logo ali embaixo do banco do carro, eu tive tempo para pegá-la, no entanto, parei no meio do caminho e decidi somente observar a cena imóvel por alguns minutos. Andei alguns metros, pensei em voltar, mas não o fiz. E dessa vez eu não sofri, pois não havia perdido uma foto, mas ganhado uma lembrança! Guardei a câmera, e segui o meu caminho! Antes de alcançar a esquina olhei pelo retrovisor e pude observar o garoto descendo do banquinho e entrando em casa.

Viajando pelas estradas do Maranhão, percorrendo os infinitos quilômetros entre os eucaliptais, as vistas já acostumadas com um verde predominante e insistente, beirando a monotonia. Não havia nada mais interessante a se olhar além do negro do asfalto e o verde das folhas. O céu limitava-se a apenas um quadrado azul escuro bem onde parecia que seria o fim da plantação, sendo na verdade somente uma pausa na idade das árvores, que criava uma diferença no tamanho delas e permitia uma leve mudança na paisagem. O rádio do carro tocava a seqüência de sertanejo do meu MP3 (eu também ouço sertanejo e vocês ainda vão se surpreender com a diversidade do meu acervo!) no momento em que me deparei com um Ipê gigantesco, majestoso, logo à margem da estrada. Suas flores amarelas desafiavam aquele verde dominante de uma forma tão desaforada que até pensei que seria realmente uma afronta! O amarelo era extremamente forte e fazia questão de roubar a cena, ali no meio do nada. Era realmente um magnífico duelo de cores que se equilibravam. Impossível passar por ali e não notar! Ah! Sim! Até lembrei-me de fotografar! 5 km depois...
Passei por ali mais 4 vezes e nunca fotografei. Somente apreciava...

Sob um sol impiedoso num domingo de agosto, às margens do Rio Tocantins durante uma visita a um povoado quase a salvo das mesquinharias humanas e suas modernidades “corrompedoras”, ocorreu outra cena mágica. Enquanto apreciava o tradicional maranhense e muito gelado “Guaraná Jesus”, observando os banhistas e as pessoas que ali se divertiam no rio e nas barracas de sapé, um homem estranho me abordou oferecendo seus artesanatos. Seus olhos muito claros eram misteriosos e sua pele tinha uma cor diferente. Principalmente da minha amarelada falta de sol. Enquanto apreciava os colares, brincos e pulseiras percebi que uma moça bem jovem havia se acomodado numa rede ao lado. Nos seus braços uma linda criança! A jovem também era de uma beleza natural particular. Tinha os cabelos lisos como as índias, porém tinha a pele clara. Os olhos negros, vivos e curiosos.
Sem nenhum constrangimento a jovem amamentava sua cria bem ali, no meio de uma confusão de sons, músicas, gritos e falas! Eu me sentia menos à vontade tomando o meu refrigerante do que ela dando peito para o filhote!
A câmera estava ligada em minhas mãos! Bastava posicionar e clicar! Até me atrevi a olhar, posicionar, ajustar o foco e me deleitar com mais uma linda foto! Simplesmente não disparei! Não fiz nada! Nem abaixei a câmera, nem tirei a foto! Somente observei maravilhado, em silêncio, a cena que se apresentava! E ali ficamos por algum tempo assim parados no tempo. A criança com o leite e eu com o meu guaraná, até o momento em que a foto desapareceu lentamente nos braços da avó que acabara de chegar!

E assim foram algumas dezenas de fotos que se foram!
E assim serão outras milhares que virão e eu não vou capturar! E estas sempre são mais valiosas, por serem livres, efêmeras e particulares!

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